quarta-feira, julho 18, 2007

A (enganadora) criatividade.

"É hoje!", você senta na frente de um velho caderno pessoal de redações, dissertações, crônicas (mais seus derivados) e pensa. Um dia chuvoso, perfeito para comer uma pipoquinha e ler um bom livro. Mas não! Você acordou com um ímpeto criativo, com uma vontade louca de colocar algo no papel e sabe que esse "algo" vai ser fantástico. "Claro, é hoje. E vai ficar fantástico! fantástico...". Pega a caneta, e sabe que aquele assunto que há dois dias você vinha pensando em transformar em crônica hoje vai ter a atenção merecida. Concentra. Escreve a primeira linha. "Não, não... preciso começar diferente. Com mais vigor, com mais força. O bom início faz uma boa crônica (é, nem sempre...)." Escreve novamente. E...novamente não gosta. "Pô, mas eu tinha tudo em mente. Acordei pensando nisso. Tinha o texto formado na cabeça. Estava alí, alí..."E a vontade de escrever continua, a criatividade pulsa em seu interior. Você sente. Mas o texto não sai. Simplesmente há algo que impede essa criatividade de se expandir, de se tranformar em algo concreto. Mas... o que será? É, você não sabe. E começa a se preocupar. "Ora, os grandes escritores, principalmente aqueles que têm colunas diárias em algum jornal, não devem sofrer desse mal. O assunto deve existir e facilmente ser desenvolvido no papel." E assim seu sonho de um dia escrever para milhões (não, nem tanto) de leitores assíduos começa a desmoronar. "Deve ser só uma má fase", pensa você. "Isso passa". Mas... e se não passar? "Ahhh, o que eu faço? Preciso escrever, preciso! ". Calma. Respire fundo. Daqui a pouco consegue. Pense em outra coisa. Mas não: "claro que eu não penso em outra coisa. Penso que tudo acabou, isso sim. Já sonhava, até, com a capa do primeiro livro. E tudo acabou.". Não faça tanto drama! Seja positiva! Esqueça a idéia de escrever e vá comer uma pipoca (sem muito sal, que os excessos nunca fazem bem) e ler aquele livro que você precisa devolver na biblioteca amanhã. "Tá aí. Gostei. Vou fazer isso. Mas o que eu queria mesmo era escrever, saiba disso. E estou indo fazer o que tu indicou só por muita insistência, só por isso." Tá, a gente acredita. Então, Ela fecha o caderno, solta a caneta, deita na cama, se satisfaz com o sagrado alimento e se deixa envolver pelos mistérios do Hypnerotomachia.

2 comentários:

Fischer disse...

Ímpeto criativo: bonito nome.
Só que há um erro alí, alí, ó.
Quando li "Mas... e se não passar?" pensei que tudo se completava... Não! Pensei que já vi isso antes, em uma crônica (ou texto, porque não devia ser um texto crônico nem dependente das forças do extinto Crono [pois é, os deuses gregos morreram quando o asteróide caiu]) da Martha Medeiros. Se não era igual, havia pelo menos um caractere diferente. (Não foi sério.)
Às vezes também tenho esses arroubos de vontade literária (bem, não é tanto; aliás, é bem menos), e a "história" no papel se torna a piada do Peter Pan: nada. Nada de catatau (isso é de comer?). E as idéias claram não podem ser tocadas, a luz escapa por entre os dedos, e só se sente o calor que, felizmente, esquenta um pouco das mãos geladas pelo inverno rigoroso eslovênio-polônio-Tcheco.

Thai disse...

Bah, bem ali mesmo. Grata, querido Eduardo.